Grand Splendid

Nesta obra arquitetônica tudo era vanguardista, contava com o que há de mais moderno em segurança e conforto. A estrutura foi em concreto armado, à prova de fogo. Foram também instaladas uma sala de primeiros socorros e equipamentos de aquecimento e refrigeração, localizados na cave para não ofuscar a sua estética. No verão o local poderia ser adaptado e optar pela brisa natural, já que havia teto deslizante na cúpula. O teatro contava com quatro fileiras de camarotes, que permanecem até hoje, e uma barraca com capacidade para quinhentas pessoas. Para a cúpula da sala do teatro, pediram ao pintor italiano Nazareno Orlandi que a embelezasse com uma pintura a óleo com uma alegoria da paz que representasse o fim da Primeira Guerra Mundial.

A história deste lugar começou com um ambicioso imigrante de origem austríaca que chegou ao país em 1890: Mordechai David Glücksman, conhecido como “Max” Glücksmann, que em 1917 encomendou o projeto de construção de um grande edifício e um novo teatro nas fundações. do qual foi o Teatro Nacional Norte, na Av. Santa Fé 1860 no Bairro Norte.


Ele chamou esse novo teatro de Grand Splendid, e foi inaugurado em maio de 1919. Acima está o prédio de dez andares com apartamentos. Pois bem, como era o modelo de negócio da época, Glücksman pensou em aproveitar aqueles apartamentos para alugá-los e assim, desta forma, recuperar o investimento necessário para se dar ao prazer de ter o seu próprio teatro.


A concepção do projecto esteve a cargo dos arquitectos Rafael Peró e Manuel Torres Armengol, e a construção dos arquitectos Pizoney e Falcope.

​​​​​​​

O que mais se destaca nesta construção de estilo eclético, no seu aspecto externo, são as estátuas de homens fortes que sustentam as varandas do terceiro andar, a linha central de varandas e o arco que fica na altura do primeiro andar que serviu de pórtico geral do teatro.

Uma ampla variedade de shows foi oferecida neste teatro. Desde peças de teatro, concertos de balé, óperas, festas beneficentes e shows de tango. Ali desfilaram grandes personalidades como Ignacio Corsini, Roberto Firpo, que lhe dedicou o tango “Gran Splendid” em 1927. O lugar se tornou um dos faróis da cultura portenha.

 

Glücksmann contribuiu para o desenvolvimento da música do River Plate através dos estimulantes “Concursos del Gran Splendid”. Por lá passaram artistas como Paquita Bernardo, apelidada de "La Flor de Villa Crespo", cujo nome verdadeiro era Francisca Cruz Bernardo, compositora de tango e primeira bandoneonista profissional argentina, falecida precocemente aos 25 anos.

 

Entre 1921 e 1930, o último andar do edifício foi utilizado como estúdio de gravação. A gravadora nacional Odeón, hoje EMI, teve aqui sua sede. E sob esse selo Carlos Gardel começou a gravar. Existe uma lenda urbana que diz que Glücksmann o ensinou a dar mais força à voz fazendo o Zorzal Criollo segurar com as mãos o encosto de uma cadeira e assim expandir a caixa torácica. A sala em que gravou ainda existe, embora não seja acessível ao público.

 

Em 23 de maio de 1923, a histórica estação Radio Splendid começou a transmitir no primeiro andar do prédio sob o nome de “Grand Splendid Theatre”. Uma imponente torre de antena inclinada foi montada no telhado. Em 1924, mudou seu nome para “Radio Grand Splendid”. E nesse mesmo ano, no dia 30 de setembro, às 22h, a dupla Gardel-Razzano iniciou uma longa audição que se revelou um grande sucesso. Quatro dias depois, Gardel apareceria como solista acompanhado pela orquestra de Francisco Canaro, fazendo uma nova e elogiada apresentação.

 

Em 1929 a emissora adotou o nome tradicional de Rádio Splendid.

 

A partir de 1926, o teatro Grand Splendid também se dedicou à cinematografia e foi palco de inúmeras estreias.

 

Em 1930, voltou a brilhar no formato teatral, só para regressar ao cinema em 1973. A partir daí, o prestigiado teatro resistiu como pôde aos anos e às crises económicas até fechar as portas.

 

Em Fevereiro de 2000, o grupo Ilhsa, que já era responsável pelas livrarias tradicionais “El Ateneo” e “Yenny”, fez um investimento de mais de três milhões de dólares para inaugurar a “Ateneo Grand Splendid” como livraria. Pela sua extensão, cerca de dois mil metros quadrados, passou a ser considerada a maior livraria da América do Sul. Cada um dos seus quatro andares é um universo diferente: no subsolo encontram-se livros, discos e filmes infantis; No rés-do-chão milhares de livros de ficção e não-ficção. No primeiro andar, os corredores armazenam livros técnicos e profissionais. Por fim, no último andar fica o setor dedicado à música clássica.

 

As estantes com livros estendem-se por todo o que antes era a sala, os caixotes transformaram-se em acolhedores locais de leitura e o palco tornou-se numa confeitaria, mantendo a sua original cortina de veludo.

Ao entrar neste local não podemos deixar de nos surpreender com tamanha beleza arquitetônica e tamanha variedade de livros. Borges mencionou certa vez: “Sempre imaginei que o Paraíso seria uma espécie de biblioteca”. Atrevo-me a acrescentar a esta famosa frase que o paraíso seria também uma espécie de livraria.

 

Em 2008, o meio inglês The Guardian classificou-a em segundo lugar entre as melhores livrarias internacionais. Além disso, em 2019, a revista americana National Geographic nomeou-a como “a livraria mais bonita do mundo”.

 

O que Max Glücksmann teria pensado ao ver que seu grande projeto para o Grand Splendid Theatre se tornaria a livraria mais bonita do mundo?